sábado, 26 de junho de 2010

SEGUNDO TEMPO: MADUREIRA 2 X ELES 2


Na noite seguinte, segundo tempo: assisti ao outro espetáculo de João Pedro Madureira: Agora Eu Era, em cartaz na SALA 309 da Usina do Gasômetro. Eu já havia visto, na mesma sala, um ensaio aberto da peça. Obviamente, cresceu bastante. Ganhou em clareza, ficou mais limpa.
A peça também ganhou figurinos novos e uma nova ambientação cênica. Os figurinos criados por Francisco Macalão são de extremo bom gosto, têm plasticidade, são delicados e oferecem beleza à cena. Combinam com a ambientação cenográfica que segue pela mesma linha. Ambos não interferem no espetáculo, no sentido que não querem aparecer mais do que a própria peça. As intervenções em vídeo nada acrescentam, aparecem mais como um modismo incomodo do que como um recurso importante.
Os quatro atores estão bem afinados, apesar da substituição de um dos atores. O quarteto se joga com força e intensidade durante o tempo inteiro. Para o bem e para o mal. As interpretações são bastante convincentes e todos parecem defender com garra as propostas da direção. Diego Bittencourt, que eu conheço de outros carnavais, ainda tem que trabalhar seus problemas vocais, mas cresceu muito desde a última vez que o vi em cena. Lucas Sampaio, meu muito conhecido, exagera um pouco e representa até quando está simplesmente fazendo o giro-sufi.
Tudo é bem marcado, limpo e definido. Mas, mesmo assim o espetáculo não me tocou. E como o que conta são as sensações que um espetáculo produz no espectador, impossível não comparar uma peça com outra, e perceber que o problema está na fraca dramaturgia que fundamenta esta peça. Nitidamente, o “texto” de Agora eu Era não tem, nem de longe, a mesma potência que se encontra em Parasitas. As descobertas do filho Camilo são primárias, os problemas familiares são pueris e os sentimentos são óbvios. Resultado: 2X2. Se tiver que escolher, veja Parasitas. Se quiser conhecer as boas propostas de Madureira, veja as duas.

MADUREIRA 1 X ELES 0

Foto: Jorge Scherer

Vi Parasitas no Instituto Goethe. Corre lá que talvez ainda de tempo de ver. Se já acabou, espere e vá ver na Álvaro Moreyra. Informe-se sobre a nova temporada.
O texto é de dramaturgo alemão Marius von Mayenburg. O texto é tão inteligente e tão carregado de um humor caústico (e agora: caústico é com ou sem acento? problemas com a reforma ortográfica), que lá pelas tantas a gente cansa um pouco. É moderno, fragmentado, forte, e plenamente eficaz, no sentido de que interessa ao espectador porque fornece pistas sobre a história, ou melhor, sobre uma história que você constrói junto com o autor. Mas, sabe quando você já entendeu a "história", e o autor continua explicando-a mais um pouco? Pois é justamente aí que cansa.
A direção é de João Pedro Madureira, que teve sua proposta escolhida entre outras nove e foi contemplado no Concurso para Novos Diretores de Teatro, promovido pelo Goethe e pela Coordenação de Artes Cênicas. Topou o desafio de encenar a peça num prazo relativamente curto com uma grana apertada. O trabalho é íntegro, moderno e acentuadamente inteligente. Madureira mostra seu talento. Acompanhando o texto de Mayengurb, o diretor coloca tanta "marquinha" de efeito na peça que chega uma hora que a gente cansa um pouco de tanta inteligência e criatividade. Trabalha muito bem com focos múltiplos e colabora com o autor ao prender a atenção da platéia.
Mas o que ganha a gente mesmo, o que mais chega a platéia, pelo menos o que mais me atingiu, foram as preciosas interpretações de Patrícia Soso e Priscilla Colombi. Que beleza. Que força magnética. Assim dá gosto de ir ao teatro. Léo Maciel, de quem gostei tanto em Clowssicos, parece preso numa camisa-de-força, e não é por representar um paraplégico. Apresenta uma interpretação descontinua, sem ritmo, que muitas vezes perde força e atração. Francisco Gick é o velho Multscher só porque está escrito no texto e é falado na peça. Não convence nem aqui nem na China.
A tendência é a peça crescer na temporada da Álvaro. Vale à pena conferir. Com certeza, a platéia presente na sessão que assisti, mostrou-se interessada nestes personagens de Mayenburg, cuja relação se caracteriza pela sentença: ruim comigo, pior sem-migo.

sábado, 12 de junho de 2010

TEATRO PÚBLICO TEM TAXA?

Tem. Quer dizer, já teve, depois não teve mais e agora tem de novo. Na Prefeitura do Fogaça e Fortunati tem. E é cara. Prejudicial e desanimadora, eu diria. 
Trata-se de uma taxa que pode ser discutida sobre mais de um aspecto. É uma taxa que pode ou não ser cobrada dependendo do entendimento de quem tem poder para aplicá-la. É uma taxa que é considerada injustiça por grande parte da classe teatral. Trata-se de um teatro público, onde se é forçado a dar ingressos para funcionários públicos. Os teatros são destinados a todas as espécies de espetáculos de artistas portoalegrenses, e por isso mesmo não têm uma "cara".  
Para colocar, por exemplo, o espetáculo Solos Trágicos em cartaz por 10 noites no Teatro Renascença, o grupo Depósito de Teatro teve que desembolsar 900 reais, como pode ser observado no comprovante acima. Em se tratando de um espetáculo nitidamente de investigação teatral, hermético, destinado a um pequeno público frequentador assíduo de teatro, àquelas poucas pessoas que dão preferência ao teatro chamado de pesquisa, é muito caro. Representa mais de 75% do dinheiro arrecadado na bilheteria.
Sabendo das características do seu espetáculo e sabendo do custo do teatro, porque este tipo de grupo pede datas neste espaço? Simples, porque quer mostrar seu trabalho e não existe outras possibilidades. Tem que forçosamente arriscar e aceitar as regras do jogo. Acontecem casos de grupos assumirem dívidas.
E a comissão que distribui as datas desconhece o teor das peças que contempla? Claro que não. Para concorrer a uma sala pública, o grupo tem que apresentar um projeto descrevendo minuciosamente o espetáculo. Além disso, a comissão é formada por "gente de teatro", então, é impossível que eles não saibam as chances que a peça tem de faturar ou não. Pelo menos numa rápida estimativa. Por que, então dão o teatro para este tipo de peça? Porque têm que ser democráticos, tem que atender a todos os tipos de demandas. E o teatro é público mesmo. Se não tiver público, azar.
Cabe salientar que, se esta taxa não beneficia os grupos, ela também não beneficia ninguém. Nem mesmo ao poder público. Tampouco aos contribuintes. É óbvio que não é a quantia arrecadada que sustenta os teatros. A parcela arrecadada é ínfima. A verba também não garante que o grupo receba o teatro com 100% de condições técnicas. Pelo contrário. A mesa de luz do Teatro Renascença, por exemplo, tem 15 anos de atividade e está cheia de problemas. Que benefício a taxa oferece ao público? Ingressos mais acessíveis? Não. Uma cota de cortesias distribuídas através de senhas? Também não. Nenhum benefício. A não ser para os funcionários da Prefeitura. 
Por que não inventar uma maneira mais inteligente e menos onerosa de cobrar do grupo uma taxa pela ocupação dos seus teatros? Quem sabe aumentar as opções. Neste caso o grupo poderia escolher pagar com ingressos cortesia ou em dinheiro. Seria a possibilidade mais óbvia. Devem existir outras. Com certeza, seria mais uma forma que a Prefeitura encontraria de incentivar, ao invés de desestimular, a realização de peças que envolvem a pesquisa teatral e outros tipos de teatro que não são tão apetecíveis aos gostos médios do público.
Aí está uma ação que poderia ser encampada pela Coordenação de Artes Cênicas, que tem por objetivo estimular a produção e a distribuição do teatro em Porto Alegre, criando formas de atender beneficamente os artistas e o público da cidade.

sábado, 5 de junho de 2010

SERVIÇO OU DESSERVIÇO?

Todo mundo sabe que o SESC faz mais coisa pela cultura do que a Secretaria de Estado da Cultura. O programa ArteSESC é uma maravilha. O projeto Palco Giratório também é uma iniciativa genial. Mas e a programação? Será que com peças como esta aí em cima o SESC está prstando um serviço à cultura? Mesmo? Será que assim o SESC está colaborando para, por exemplo,  a formação de platéia? De que adianta as boas e importantes peças que aparecem no Palco Giratório, se ao mesmo tempo coloca em circulação esta comédia para toda a família?
Antes que alguém me chame de preconceituoso por estar julgando um espetáculo apenas pelo cartaz, já que não vi a peça, quero dizer apenas que a foto me remete a um tipo de teatro que lembra uma farsa, uma comédia ligeira, provavelmente de temática rural, com personagens facilmente reconhecíveis pelo público e interpretações baseadas em tipos e clichês. de fácil compreensão. Poderíamos dizer que se trata de um besteirol. Apenas estou utilizando este cartaz como ilustração para chamar atenção que este tipo de espetáculo cômico (de qualidade ou não, não é isso que está em questão), estas comédias leves, estão aparecendo em grande número na programação do ArteSESC. E encontramos platéias despreparadas para assistir um espetáculo denso. Isso determina um tipo de produção e estimula um certo tipo de gosto ao público médio. O que está e jogo é avaliar e repensar a tremenda responsabilidade pela cultura que está sendo distribuída pelo ArteSESC.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

UM TEATRO QUE DIZ "MERDRA"

Este, no centro da foto, é Jean Vilar, em 1968, três anos antes de sua morte. Ele foi um ator, diretor e uma das personalidades mais influentes do teatro francês. Refletindo sobre o Festival de Avignon, criado por ele, escreveu:
"Claro que um artista deve, antes de qualquer coisa, compreender as realidades e necessidades do homem de seu tempo. Contudo, o teatro somente é válido, tal como a poesia e a pintura, na medida em que, precisamente, não cede aos hábitos, aos gostos, às necessidades, com frequencia gregários, da massa. Ele só interpreta bem seu papel, só é útil aos homens se abala suas manias coletivas, luta contra suas escleroses, diz-lhes como o pai Ubu: Merdra!"
É isso aí, Vilar.
Esta citação inaugura aqui no blog a série Reflexões Alheias.

terça-feira, 1 de junho de 2010

FEBRE DE MOLIERE - O AVARENTO

E lá fui eu assistir O Avarento. Confesso que, principalmente, para ver em cena alguns amigos, colegas de profissão. Elison Couto, antigo colega de  vários elencos; Plínio Marcos, velho companheiro de Depósito de Teatro; e Lúcia Bendatti, ou Lucinha para os íntimos, a quem já tive oportunidade de dirigir em Boca de Ouro. Ainda bem que todos meus amigos estão muito bem na peça (o quê não dá pra se dizer de todo o elenco). Plínio, que está entrando agora, e Elison, apenas corretos. Nem sempre suas gags se traduzem em risadas da platéia. Mas, Lucinha está matando a pau. Tira excelente partido de sua personagem, e não tem chute disperdiçado. Bola na rede. Joga com a platéia, dá uma que outra apeladinha, mas faz o público rir, o que, afinal de contas, é o fundamento da comédia. A peça é dirigida por Gilberto Fonseca, que optou por fazer uma peça de Molière como se estivéssemos vivendo na época de Molière. Uma espécie de reconstituição arqueológica. Figurinos de época, salamaleques à la Luís XIV, e mais um conjunto de velharias que contaminam a interpretação dos atores e engessam o espetáculo deixando-o com sabor de mofo. A encenação não resistiria uma ánalise mais aprofundada. O texto é datado e previsível. Se agrada ao público talvez seja porque eles (a platéia) também tenha em seu imaginário o teatro feito na época de Molière, ou no máximo, um teatro do século XIX. É bonito de se ver, mas cansa na primeira meia hora porque se sabe que vai continuar assim até o final. De minha parte, deixaria Molière descansando nas glórias do passado.

AO SUCESSO COM JOÃO DE RICARDO

A performance se chama Homem que não Vive da Glória do Passado. O performer é o ator e diretor João de Ricardo. Cheio de idéias, com uma corajosa exposição, alguns textos bons e alguns momentos ótimos. O novo e o velho misturados numa busca fragmentada, enganadora e cheia de perguntas sem respostas. Provocante, sim. Lá pelas tantas cansei. Já estava de bom tamanho. Trabalho arriscado e, com certeza, polêmico. Mas, uma das características da arte é justamente esta: provocar polêmicas. Eu curti.

CHAPEUZINHO AMARELO

A primeira peça que assisti ao voltar de férias foi Chapeuzinho Amarelo. Já tinha visto esta história do Chico Buarque, há algunas anos atrás, encenada pelo Dilmar Messias. Era tão boa quanto tudo que o Dilmar faz para crianças. Mas esta montagem que vi agora assinada pelo Paulo Guerra foi uma boa surpresa. Surpresa porque não parece peça do Paulo Guerra. Há anos que este diretor se dedica ao teatro infantil com peças mais ou menos comerciais, que repetem mais ou menos a mesma fórmula. Desta vez está diferente. Mais inteligente, mais moderno. Senti a mão dos atores se metendo na concepção da peça. Aliás, o trio está ótimo, bem afinado e ágeis nas marcações corporais que recheiam o espetáculo. Apesar da interpretação idiotizante de crianças de peça infantil, os três atores agradam as crianças da platéia. A historinha é meio babaca. Já é no original do Chico, e continua na adaptação de Artur José Pinto. É pretensamente inteligente. Mas, sou mais Perrault. Mas não do que escrevo invalida a peça, que muito agradável e divertida.